sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

VAMOS IMPRIMIR DINHEIRO?

O imaginário popular está cheio de provérbios citando o dinheiro. Eis alguns:

1) “Dinheiro não traz felicidade, manda buscar”.
2) “Tempo é dinheiro”.
3) “Dinheiro e mulher bonita, governam o mundo”. E muitos outros do gênero.

Ora! Se dinheiro é tudo isso, e, como o vil metal está raro para muita gente, só me resta fazer um convite ao amigo leitor: Vamos fazer dinheiro?

Antes, porém, seria interessante procurar entender por que os ricos estão cada vez mais ricos e, inversamente, por que os pobres estão cada vez mais pobres?

Para entender essa visível contradição torna-se oportuno observar que, cerca de 95% de todo o numerário em circulação na economia mundial, encontra-se concentrado nas atividades financeiras especulativas.[1]. Isto explica porque tantas economias debilitadas são privadas de recursos para realizar investimentos produtivos, com repercussões perversas na qualidade de vida de suas populações.

Uma outra questão relacionada à concentração mundial da renda, decorre do fato do dinheiro ganhar vida no capitalismo. Isto explica porque, dada as ações protagonizadas pelas inversões financeiras, o dinheiro gera mais dinheiro, através dos juros, elevando assim a riqueza de seus possuidores.

Importa observar que, ao chamar o público leitor para imprimir dinheiro, na verdade eu falo do chamado dinheiro social, que, ao contrário do meio circulante oficial, não gera exclusão, mas seu inverso, a inclusão econômico-social.

Os indecisos que ainda não definiram se vão ou não aceitar o convite feito acima, muito provavelmente estarão se perguntando: - Mas então o que são e como funcionam as moedas sociais?

Vamos por parte. Moedas sociais são instrumentos emitidos e administrados por seus usuários, membros associados de coletivos, que se pautam por princípios de cooperação, solidariedade e justiça social, atuando de forma complementar ao meio circulante oficial. Portanto, seu uso faz economizar a utilização das moedas correntes, ampliando, por conseguinte, a capacidade de compra do consumidor.

Algo salta à vista de imediato: as moedas sociais favorecem a produção e não a especulação. Isto porque tais moedas não geram o pagamento de juros[2], não induzindo, por sua vez à sua acumulação. Seu valor não é intrínseco, mas está em estimular os fluxos de produção, circulação e consumo de produtos, serviços e saberes nas economias locais.

As moedas sociais são freqüentes nos clubes de troca, estimulando e incluindo, no processo produtivo, elevado contingente de trabalhadores não absorvidos pela economia formal, expulsos pela modernização produtiva (os não tão jovens) ou, impedidos de entrar, por falta de experiência (aqueles mais jovens).

Nas comunidades que avançaram em seu grau de organização, o uso da moeda social tem seu raio de ação ampliado, promovendo ações de forte viés emancipatório, com a criação dos chamados bancos comunitários[3]. Dentre estes, destacam-se, dois exemplos exitosos: o Banco da Aldeia, em Bangladesh, na Ásia e, no Brasil, o Banco Palmas, na periferia de Fortaleza-Ceará.

Importa ainda salientar que o uso da moeda social tem grande caráter pedagógico, tornando explicitas as relações que permeiam o uso da moeda oficial e seu papel no fortalecimento da economia capitalista, excluindo, por via da conseqüência, as condições de promoção do bem viver coletivo.

O uso da moeda social, por estar relacionado à demanda na economia local, fortalece a geração de trabalho e renda, permitindo, a um maior número de pessoas, produzir e consumir de forma consciente, criando condições de empoderamento[4] de pessoas e comunidades.
Portanto, a criação de moeda social é conseqüência da conscientização de que, as verdadeiras mudanças sociais não acontecem ao acaso e, muito menos, fruto da ação individual de algum “iluminado”, porém, ao contrário, através de práticas coletivas com foco no ser humano, e que possibilitem o bem viver coletivo.

Depois dessas considerações é oportuno voltar ao começo da conversa: Vamos imprimir dinheiro?




[1] Disponível em http://www.geranegócio.com.br/html/geral/microcrédito/trocaed.html, acessado em 23 de fevereiro de 2009.
[2] Há uma corrente de pensadores, tendo à frente o austro-alemão Sílvio Gesell (1862-1930), que propõe que a moeda social deva gerar juros negativos, estimulando, dessa forma, o exercício da função maior da moeda, qual seja a intermediação das trocas.
[3] Existem hoje no Brasil, cerca de 35 bancos sociais, segundo dados recentes da Secretaria Nacional de Economia Solidária – SENAES.
[4] Entendido como as condições nas quais as pessoas aprendem que o poder está com elas e com seu coletivo.

2 comentários:

Rodrigo Pena disse...

Na verdade a moeda social só tem valor no clube de troca, e esta longe ou inviável talvez, de fazer parte da economia como um todo (Macroeconomia).
Estou certo?
Desde de já obrigado pela sua atenção.

Roberto G. Brito Lira disse...

Caro Rodrigo,
Você está coberto de razão ao afirmar que a moeda social é de circulação restrita, impactando, inicialmente, apenas na economia local.
No que diz respeito à possibilidade da moeda social expandir seu raio de influência ou, como você afirma, de fazer parte da economia como um todo, tudo dependerá da expansão na difusão de outros instrumentos da economia solidária, tais como clube de trocas solidárias, microcrédito relacionado à produção, consumo e investimento, empresas recuperadas pelos trabalhadores trabalhadores, cooperativas e associações autogestionadas, a formação de redes de emprendimentos de economia solidária entre outros.
Portanto, meu caro Rodrigo, a expansão da prática econômica voltada para o empoderamento de pessoas e empreendimentos é um projeto de médio ou longo prazos, visto que os valores e práticas capitalistas, embora hegemônicos, já externam sinais de senilidade dadas as contradições que lhes são intrínsecas.
Agradeço suas indagações, peço desculpas pela demora em respondê-las e, desde já, assumo um compromisso de respondê-lo imediatamente, caso você torne a acessar este blog.